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Tecnologias 'humanas por design' na economia digital


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Ao olhar para a história, é natural presumir que a tecnologia sempre esteve na essência da nossa existência. Afinal, somos nós, humanos, que concebemos, construímos e utilizamos a tecnologia ao longo dos séculos. No entanto, ao examinar mais de perto essa relação, é surpreendente perceber que, por mais que tenhamos moldado o mundo ao nosso redor com ferramentas e invenções, elas raramente refletem nossa própria humanidade.

Apesar disso, as tecnologias têm permitido aumentar o potencial de nossas habilidades, assim como auxiliar na superação das limitações humanas em atividades de maior ou menor complexidade. O que sempre esteve em jogo era desenvolver tecnologias sensíveis às necessidades, desejos e preferências humanas em variadas circunstâncias sociais, econômicas, políticas e culturais. Com o tempo, atender apenas a esses requisitos se tornou insuficiente, levando os designers de produtos e serviços a considerarem outros fatores no desenvolvimento de soluções aos desafios contemporâneos.

As abordagens do Design Centrado no Usuário (DCU), do Design Centrado no Humano (DCH) e do Design por Humanos (DH) buscaram lidar com esses desafios. Ao contrário do que se pode pensar, tais abordagens não são excludentes, são complementares, pois ampliam o olhar do designer para diferentes elementos e aspectos a serem considerados no desenvolvimento de novas tecnologias.

Atendendo às necessidades e preferências do usuário

O design centrado no usuário diz respeito a um processo criativo de resolução de problemas que privilegia o usuário de um produto, serviço ou processo ao longo de todo o seu desenvolvimento. Nessa abordagem, é fundamental que o designer tenha uma compreensão clara das necessidades, preferências e comportamentos dos usuários para o desenvolvimento das soluções. Além disso, é essencial que se faça uma análise regular, com a incorporação de feedbacks, por meio da coleta de dados e de pesquisas, além de testes de usabilidade para melhor ajustar os produtos e serviços às expectativas dos usuários.

A plataforma de streaming de vídeo Netflix é um exemplo de design centrado no usuário. A empresa utiliza algoritmos sofisticados para recomendar conteúdo com base nas preferências e no histórico de visualização de cada usuário, personalizando a experiência de streaming para atender às necessidades individuais de seus clientes. Outro exemplo prático é o Google Maps, que fornece uma interface intuitiva e fácil de usar para navegar em mapas, obter direções e encontrar locais de interesse. Recursos como o planejamento de rotas personalizado com base no trânsito em tempo real e a integração com o transporte público tornam o aplicativo altamente funcional e valioso para os usuários.

Um olhar para as questões éticas, sociais e ambientais

O design centrado no humano, por sua vez, apresenta uma nova forma de pensar e desenvolver produtos e serviços. Além de se concentrar nos usuários finais, o DCH também considera o impacto mais amplo do design do produto ou do serviço nas pessoas e no mundo ao seu redor. Isso inclui preocupações éticas, ambientais e sociais que buscam garantir que o design seja responsável e sustentável.

Para isso, é fundamental que o designer deixe de lado sua forma de olhar para as coisas, tornando-se mais receptivo às novas ideias e visões de mundo. Isso só é possível porque ele passa a atuar em conjunto com uma equipe multidisciplinar e com os consumidores (ou potenciais consumidores) no processo de melhoria ou de desenvolvimento do novo produto ou serviço. A empatia e a escuta ativa são os grandes diferenciais dessa abordagem.

Sistemas de bicicletas compartilhadas, como o Bike Itaú, foram desenvolvidos com base no design centrado no humano para promover a mobilidade urbana sustentável. Esses serviços oferecem bicicletas acessíveis e convenientes para os moradores locais, contribuindo para a redução do tráfego e da poluição nas cidades. Outro exemplo de produto com design centrado no humano é o Hand Talk. Trata-se de um aplicativo brasileiro que utiliza inteligência artificial para traduzir textos e áudios para a Língua Brasileira de Sinais (LIBRAS), facilitando a comunicação entre pessoas surdas e ouvintes. O aplicativo foi desenvolvido com base nas necessidades da comunidade surda, garantindo acessibilidade e inclusão digital.

"Humanização" da tecnologia

Para o desenvolvimento das tecnologias humanas by design, a abordagem não é mais simplesmente centrada no usuário ou no humano. A proposta é que a tecnologia seja, ela mesma, humanizada, isto é, projetada para ser o mais humana possível. Além de se tornarem mais intuitivas e acessíveis, essas tecnologias buscam simular o ser humano física, social e cognitivamente. E são programadas para agir de uma forma que demonstre empatia e compreensão dos problemas notadamente humanos. Para isso, devem ser desenvolvidas incorporando valores éticos e considerando seus impactos sociais mais amplos.

Um exemplo de tecnologia humana by design é a robótica que tem avançado a passos largos, construindo robôs cada vez mais humanoides, inclusive com expressões faciais e gestuais que inspiram emoções e sentimentos dos humanos. Outro exemplo são os chatbots de IA, como o ChatGPT e o Gemini (antigo Bard). Eles estão sendo utilizados por pessoas comuns como fontes de informação e conhecimento, como ajudantes em tarefas cotidianas e interlocutores de experimentações, reflexões e criações antes mesmo de as escolas, as empresas e os governos tomarem medidas para incentivar e regulamentar esse uso. Outro exemplo são as redes sociais, desenvolvidas para reproduzir da forma mais aproximada possível as comunidades e as formas de relacionamento da vida off-line.

O que vem pela frente?

Estamos vivendo uma grande mudança de paradigma, com implicações técnicas, éticas, sociais, culturais e econômicas desafiadoras. As novas tecnologias criam pontes intuitivas, relacionais e mesmo afetivas incontornáveis com seres humanos. Contudo, vale lembrar que, por mais sofisticada que seja, a tecnologia não tem (ainda?) os atributos que nos tornam humanos e tão complexos, autonomia, raciocínio crítico e a capacidade de sentir emoções.

Preparar os indivíduos na transição para uma economia digital exige esforços colaborativos por parte das empresas, dos governos, dos educadores e de outras partes interessadas. Ações efetivas no sentido de promover a inclusão digital, desenvolver competências digitais entre estudantes e profissionais, e garantir a segurança dos dados contribuem para que as sociedades se preparem melhor para um futuro em que as atividades humanas serão realizadas de forma cada vez mais integrada com as tecnologias.

O desafio é estruturar as bases éticas e sustentáveis para o desenvolvimento do futuro que queremos. As escolhas de agora serão fundamentais para direcionar e melhor conciliar o desenvolvimento tecnológico com os princípios humanos.

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